nossa rua não foi feita pra brincar


meus passos são amargos como o gosto do cigarro. caro. avulso. 1 real. o isqueiro tá atrás da mesa, minha filha.
e se por um acaso, me vissem com meu trago poderiam fazer um estrago. como minha casa ficou, em fiascos, com mais uma discussão vazia. sinto dores.

domingo de páscoa.

eu queria virar fumaça. mas tomo vergonha na cara e sem piedade aguento firme. continuo caminho, imaginando a minha família brigando. imagino sempre o pior, imagino porque faço parte e porque a culpa talvez pode ser minha. a falta de diálogo, de paz e delicadeza. ou a falta de compreensão, já que toda família é humana. e todo humano pulsa raiva.

e quisera eu, meu Deus, não pensar nessas coisas e agir com um pouco mais de indecência e praticidade. estampar no peito a bandeira do foda-se e viver com a intensidade de um vulcão a minha vida pacata. quebrar o controle. mas atrás de mim, vem a vontade de me alinhar. então eu paro.

paro, atravesso a rua. vejo crianças brincando. vejo moleques brincando de bola. entre chutes, palavrões e vozes infantis, a rua movimentada da semana parece uma rua de bairro nesse domingo. tem um bar na esquina. tem crianças brincando de bola no meio da rua. eu resolvo não entrar, e sento na calçada, pra ver eles jogarem. sinto uma nostalgia que me acalma. a criança diz "foda-se", "vai tomar no cu" de uma maneira tão feliz e viva. eu queria xingar assim. queria ser assim sem xingar. e quando eles brigam? as gordurinhas da barriga dançam. pegam na bola como se fosse o tesouro mais procurado. e a bola bate nas portas dos comércios, e voltam para os pés do menino-rei. todo menino é um rei. a simplicidade do domingo me afasta da vontade de me despedir do mundo.



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